Fonte Correio Brasiliense Edição: Adilson Gonçalves

Sentado em uma cadeira branca e acolchoada no 10º andar do anexo B do Palácio da Justiça, o juiz conta que teve uma infância típica do Brasil rural. Feliz, mas laboriosa. A escola construída por insistência do seu pai ficava a 23 quilômetros de distância de casa, o que obrigou Fábio e os dois irmãos mais novos a morarem na escola.

Aos 15 anos, lembra que "teve a sorte" de ingressar em um programa assistencial do Banco do Brasil chamado Menor Carente, onde experimentou, pela primeira vez com mais percepção, o peso do racismo institucional. Trabalhava com outros dois adolescentes, também bons colaboradores, mas sempre sentiu que precisava fazer o dobro para ser considerado bom.
Foi durante a primeira experiência no mercado de trabalho que decidiu ser juiz. "Eu não sabia o que era exatamente isso, mas eu queria para mim, algumas pessoas não acreditaram, mas estava com a ideia muito fixa na mente. Claro que me questionavam. Como alguém do interior, pobre, estudante de escola pública e negro queria seguir uma profissão que não era acessada por esse perfil?", lembra. É que o racismo, quando não mata, busca tornar o alvo inseguro. "Eu sempre tinha que fazer 25% melhor que qualquer pessoa. Então, não era ser o melhor por ser ‘o melhor’, mas ser o melhor para ser igual."
Combate ao racismo
Na universidade, foi interpelado por uma professora, que disse que ele não tinha "perfil para a magistratura". Em outro episódio, um professor o insultou racialmente durante uma discussão. "Discordamos em uma questão e ele perguntou quem tinha cortado o rabo do macaco. Ali foi como se eu tivesse tirado minha segunda certidão de nascimento. Nasci novamente, como identidade, como um homem negro".

Em 2016, foi eleito presidente da Associação dos Magistrados do DF (Amagis). Incomodado com a inexpressividade dos negros na magistratura, desde 2017 faz frente ao Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros (Enajun). Uma oportunidade de reflexão sobre a representatividade, tanto para os juízes negros como para uma sociedade que ainda não encontra no Judiciário a sua projeção racial. "A proposta do encontro é dizer que a magistratura deve ser uma só, e deve ser plural."
Os avanços, ele diz, são substanciais, mas ainda é preciso percorrer um longo caminho, pois a disparidade entre negros e brancos ainda é um abismo no Brasil. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que, em 2015, o número de negros entre 18 e 24 anos que chegou ao nível superior era de 12%, ou seja, menos da metade dos 26,5% de brancos.
O IBGE destaca ainda que a dificuldade de acesso dos negros se dá pela educação defasada recebida por essa parcela da população. No tempo em que deveriam estar matriculados em universidades, 53,2% dos negros ainda estão no ensino fundamental ou médio, ante 29,1% de brancos.Fábio se torna uma figura mais rara porque a distância entre brancos e negros na magistratura é ainda maior. Pessoas negras representam apenas 1,6% dos magistrados do Brasil, em um universo de mais de 18 mil juízes. Ainda assim, ele não perde o otimismo. "Sempre digo aos jovens: seja negro, mantenha sua história, não abra mão da sua identidade e busque o melhor disso. Hoje posso dizer que é possível o negro também ocupar esse espaço na magistratura", finaliza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário