Edição: Adilson Gonçalves Fonte Terra
Texto e fotos Carla Ruas
O 28 de agosto de 1963
foi um divisor de águas nos Estados Unidos. Naquele dia de verão, mais de 250
mil pessoas participaram da Marcha por Trabalho e Liberdade, na capital
Washington, para pedir igualdade racial. Dentre os diversos líderes que subiram
em um palco montado nas escadarias do Lincoln Memorial, um se destacou:
Martin Luther King. O seu discurso "I have a dream" ("Eu tenho
um sonho", na tradução do inglês), que faz 50 anos nesta quarta-feira,
ajudou a impulsionar medidas que mudaram para sempre a trajetória dos
negros nos Estados Unidos.
Já
haviam ocorrido muitos protestos contra a segregação racial no país, mas nenhum
tinha sido tão grande como a marcha de 1963. Um momento histórico que alavancou a
criação da Lei dos Direitos Civis (1964) e da Lei dos Direitos de Voto (1965) e
que ficou na memória de muita gente. O Terra conversou
com três pessoas que estavam lá e fizeram parte desta história: um militante
dos direitos civis, um funcionário do escritório do presidente John F. Kennedy
e um fotógrafo que estreiou como profissional registrando o mar de gente
naquela tarde quente de agosto.
O militante incansável
Jim Crocket lembra
bem daquela quarta-feira, em 1963. Aliás, sua memória é impressionante para
quem já viveu 88 anos. "Estava muito quente e quando eu cheguei já tinha
um mar de pessoas. Mas eu fiquei encantado, e perguntava para todo mundo de
onde vieram, porque algumas pessoas tinham viajado dias para chegar lá",
recorda.
Para participar da
marcha, Crocket também teve que fazer sacrifícios: faltou ao trabalho e viajou
uma hora de ônibus até a capital. Mas para ele foi uma decisão muito natural.
Desde os anos 1940 ele vinha participando do movimento dos direitos civis. Numa
fotografia de 1951 ele aparece com apenas 23 anos, protestando em frente a um
teatro que barrou a sua entrada só porque ele era negro.
"Eu frequentei escolas segregadas, não pude entrar em certos restaurantes e durante a segunda guerra vi prisioneiros serem tratados melhor do que eu."Jim Crocket
Este foi apenas um dos
preconceitos que Crocket enfrentou na sua vida. Mesmo após a abolição da
escravatura, os negros continuaram sendo considerados cidadãos de segunda
classe nos Estados Unidos. “Eu frequentei escolas segregadas, não pude entrar
em certos restaurantes e durante a segunda guerra vi prisioneiros serem
tratados melhor do que eu”, lamenta.
Depois da guerra,
Crocket se tornou bombeiro, mas logo percebeu que jamais seria promovido por
causa da sua cor. Por isso resolveu fazer curso superior e, em 1963, foi um dos
primeiros negros a entrar na universidade Johns Hopkins, em Baltimore. Após
completar o curso de administração, abriu uma imobiliária bem-sucedida, que
existe até hoje. “Mas nada disso seria possível sem as vitórias do movimento”,
garante.
O funcionário de Kennedy
Alfred Boyd, hoje com 83 anos, também admirou a multidão ao chegar na marcha em
1963. Mas a sua motivação para ir ao evento não veio das ruas, e sim de
dentro do seu escritório: Ele trabalhava para a administração do presidente
John F. Kennedy, onde tentava promover legislações que melhorassem a vida dos
negros.
Boyd
veio de uma família com uma trajetória dentro do movimento dos direitos civis.
A sua prima Mary McCloud, é uma figura conhecida por ter buscado o direito ao
voto e educação para mulheres negras na década de 1920. Mary, cujos pais tinham
sido escravos, se tornou conselheira e amiga pessoal do presidente Franklin
Roosevelt. Boyd quis continuar esta trajetória. Por isso, depois que
Kennedy foi assassinado em novembro de 1963, ele continuou atuando no governo
do presidente Lyndon B. Johnson, que assumiu o cargo. O seu trabalho era criar
projetos sociais e econômicos para os negros no Escritório de Administração e
Orçamento.
Mas ele admite que as
grandes mudanças só aconteceram depois da marcha em Washington: “O movimento
mostrou para o mundo inteiro a discriminação que sofriam as minorias. E o
governo se sentiu obrigado a passar legislações que mudaram completamente o
jogo”.
"O movimento mostrou para o mundo inteiro a discriminação que sofriam as minorias".
Alfred Boyd
O fotógrafo
Existem muitas fotografias que compõem o imaginário da Marcha em Washington por Trabalho e Liberdade. Algumas dessas imagens foram tiradas por Rowland Scherman, hoje com 67 anos. E ele nunca vai esquecer daquele dia, afinal, fotografar a marcha foi o seu primeiro trabalho profissional.
Existem muitas fotografias que compõem o imaginário da Marcha em Washington por Trabalho e Liberdade. Algumas dessas imagens foram tiradas por Rowland Scherman, hoje com 67 anos. E ele nunca vai esquecer daquele dia, afinal, fotografar a marcha foi o seu primeiro trabalho profissional.
"Eu entrei num verdadeiro transe, e fotografei o dia inteiro sem parar para comer ou beber", lembra Rowland Scherman, hoje com 67 anos
“Eu entrei num
verdadeiro transe, e fotografei o dia inteiro sem parar para comer ou beber”,
lembra. E como ele estava trabalhando para a Agência Nacional da Informação
(USIA) e não para a imprensa, tinha mais liberdade sobre o que fotografar.
Scherman escolheu focar suas lentes nas expressões dos participantes, o que
hoje compõem um importante arquivo visual e histórico do evento.
Num dos seus retratos,
o fotógrafo captou a jovem Edith Payne, de apenas 12 anos, olhando direto para
a câmera. “Eu vi umas pessoas rindo e outras chorando, até que ela me chamou a
atenção. Ela era tão jovem e estava tão envolvida”, descreve. A imagem virou um
dos símbolos do movimento dos direitos civis, já que simboliza as novas
gerações e a esperança de um futuro melhor.
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