Edição
Adilson Gonçalves Fonte Estadão
Joel Zito
Araújo é um cineasta preocupado com a discriminação racial no Brasil. Sua obra
gira em torno do tema, em obras documentais como A Negação do Brasil (livro e
filme, sobre a invisibilidade do negro na dramaturgia brasileira) e ficcionais,
como Filhas do Vento, vencedor de oito kikitos em Gramado. Seu novo trabalho,
Raça, feito em parceria com a documentarista norte-americana Megan Mylan, vai
na mesma linha.
Raça
elege três pontos de vista para convergir na discussão do mesmo problema. No
primeiro, acompanhamos os dez anos de luta parlamentar para aprovar o Estatuto
da Igualdade Racial. No segundo, a batalha dos moradores do Quilombo de
Lizarinho para evitar que uma multinacional se apodere de suas terras. No
terceiro, a saga da implantação da TV da Gente, veículo de comunicação cujos
dirigentes e funcionários eram, em sua maioria, negros.
Os
segmentos narrativos se interligam e se alternam ao longo do documentário. E
cada um possui uma espécie de condutor, nessa que é uma luta coletiva por
direitos. No plano político, o destaque é do senador Paulo Paim, em suas
negociações pela aprovação do Estatuto. Entre os quilombolas, a carismática
Dona Miúda. E, na luta pela implantação da TV, o cantor Netinho de Paula.
Raça
é um exercício de cinema direto, com as câmeras acompanhando os personagens
durante vários anos. Ou seja, a ideia de base é captar não um resultado
alcançado, mas um processo feito com muita dificuldade e que raramente evolui
em linha reta. Pelo contrário, como são muitas as resistências, esses
personagens veem-se obrigados ora a negociar, ora a pressionar, ou arrumar
aliados às vezes inesperados para fazer com que suas causas andem.
Por
um lado, nota-se a crítica embutida na maneira como as falas dos personagens e
suas ações são colocadas na tela. O pressuposto, implícito, é de que a
sociedade teve informações muitas vezes incompletas ou unilaterais sobre temas
como as cotas raciais, a posse da terra ou o oligopólio dos meios de
comunicação. O filme cava seu espaço nesse vácuo, nessa carência informativa.
Por
outro, há também a decisão de não dar por findo um percurso ainda em suspenso.
Precisa-se ir ao Google para saber o que foi feito da TV da Gente. O filme não
informa. As conquistas, mesmo que aparentemente históricas, parecem ainda
frágeis e provisórias. É um inacabamento iluminador. Sugere que a luta mal
começou.
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