Reportagem de Jorge Félix
Reprodução do Site Poder Online
Caó: "A Justiça tem que condenar Bolsonaro para ver que lei é pra valer"
Há mais de 20 anos, o então deputado Carlos Alberto Caó de Oliveira (PDT-RJ) conseguia aprovar na Assembléia Constituinte a lei estabelecendo o racismo como um crime inafiançável e fazer do texto uma cláusula pétrea da Constituição - o que significa dizer que só pode ser retirada de lá ou alterada por outra Constituinte. Atualmente dirigindo a Ong Igualdade já, sem mandato desde 1990, Caó, 69 anos, acredita que dificilmente o Supremo Tribunal Federal poderá absolver o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) depois de suas declarações racistas e homofóbicas. "Agora a coisa pegou", diz. Nesta entrevista ao Poder Online, Caó defende: "A Justiça tem que condenar Bolsonaro para ver que lei é pra valer".
Caó: "Agora a coisa pegou." |
Poder Online - Como analisa o caso Bolsonaro?
Caó - Agora a coisa pegou. Ele ainda está tentando uma defesa, dizendo que não entendeu a pergunta, que não foi bem assim. Mas o racismo ou a homofobia sempre são escamoteados em declarações disfarçadas. O que espanta mais no caso dele é a rudeza. As declarações são escancaradas. Ele não faz questão de dizer que pensa de outra forma, simplesmente porque não pensa assim.
Poder Online - Mais de vinte anos depois, a sua lei pegou?
Caó - O racismo não desapareceu nem vai desaparecer. Mas a lei pegou, sim. Há hoje na sociedade uma consciência de que racismo é um crime. A sociedade passou a ser menos tolerante, a exigir igualdade e a não aceitar a discriminação. O que faz a lei pegar é a punição.
Poder Online - Mas o deputado Bolsonaro já se livrou de seis processos. Considera que por ter foro privilegiado facilitaria a absolvição já que o Supremo Tribunal Federal nunca condena um político?
Caó - Tem que ter a primeira vez. A Justiça tem que condenar Bolsonaro para ver que a lei é pra valer. Não é letra morta da Constituição. É uma cláusula pétrea! É preciso a condenação para estimular outras pessoas que passam por discriminação a denunciar o crime. É como no caso da violência contra as mulheres. Se houver impunidade, a vítima é que sofre. Mas eu sinto que a sociedade brasileira já não aceita mais isso.
Poder Online - Acredita que seria necessário algum aperfeiçoamento da lei depois de tanto tempo?
Caó - A melhor maneira de aperfeiçoar a lei é aplicá-la. Quanto mais julgamentos, mais casos virem ao conhecimento da sociedade melhor será a aplicação da lei.
Poder Online - O Estado deveria fazer algum tipo de campanha para divulgar a lei, esclarecer e incentivar as pessoas a denunciarem o racismo?
Caó - Sem dúvida isso seria muito importante. Afinal de contas, o racismo historicamente foi um crime de Estado. A escravidão foi um crime e é reconhecido como tal. Se o Estado não esclarecer, estimular a denúncia, será cada vez mais cúmplice e uma parcela da sociedade, uma parcela dos eleitores pode acreditar que votar em políticos com essa visão é aceitável.
Poder Online - Seu último cargo público foi na década de 1990. Pensa em se candidatar de novo?
Caó - Estou pensando, sim. Casos como este me estimulam a voltar.
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