quinta-feira, 31 de maio de 2012

CAÓ E INTELECTUAIS NEGROS PARTICIPAM DO SEMINÁRIO SOBRE ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA, PROMOVIDO POR LEONEL BRIZOLA NETO

Edição Adilson Gonçalves
Texto: Letícia Coimbra
Fotos: Fabiane Karine
Uma mesa redonda com a participação de importantes personalidades ligadas ao movimento negro no Brasil debateu no auditório da CMRJ, dia 11, a abolição da escravatura, com o tema “13 de maio, Realidade ou Ilusão?”
Com mediação do vereador Leonel Brizola Neto, a mesa debatedora foi composta pelo deputado Caó, Carlos Alberto de Oliveira, autor da Lei contra o racismo no Brasil, o secretário de Trabalho, Emprego e Renda de Nova Iguaçu, Luis Eduardo, a Iyalorixá, Mãe Edelzuíta, do Instituto Nacional e Órgão Sacerdotal da Tradição e Cultura Afro-Brasileira, a professora Dulce Vasconcelos, presidente do Comdedine/RJ (Conselho Municipal de Defesa dos Direitos dos Negros) e a professora Eliza Larkin, do Ipeafro (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros), viúva de Abdias Nascimento, único negro a se tornar senador no Brasil e candidato ao prêmio Nobel da Paz em 2010, falecido no ano passado.
Caó, cujo nome está ligado a maior conquista da causa anti-racista no Brasil, conquistada em 1989, com a legenda do PDT, lembrou que a abolição foi fruto do movimento protagonizado pelos negros e simpatizantes da causa, embora a história não mostre desta forma. “Várias manobras foram feitas para esvaziar a causa abolicionista, como a Lei dos Sexagenários, que na prática libertava o dono do escravo, que aos 60 anos estava velho e desgastado, da obrigação de sustentá-lo, e da Lei do Ventre Livre, que não libertava ninguém… O Brasil foi um dos últimos países do mundo a abolir a escravidão, e fez isso sem qualquer projeto ou planejamento para incluir os negros na vida social e econômica do país, foram simplesmente jogados para a mendicância”, disse.
Caó lembrou que, em 1889, Ruy Barbosa mandou queimar todos os documentos relativos à entrada de escravos no Brasil e registros sobre a escravidão, destruindo assim importantíssima documentação deste período da história do Brasil. A intenção do jurista foi evitar que os antigos donos de escravos entrassem com processos de indenização contra o Estado, porém, o método que usou foi desastroso do ponto de vista histórico para a memória da cultura afrobrasileira. “Por tudo isso, nossa data é mesmo o 20 de novembro”, concluiu Caó, em alusão a Zumbi dos Palmares e ao Dia da Consciência Negra, que no Rio de Janeiro é celebrado com feriado graças a Darcy Ribeiro, Secretário de Cultura, e ao governador Brizola, que instituiu a data no calendário oficial.
Mãe Edelzuíta, herdeira espiritual de Mãe Menininha do Gantois, o mítico terreiro de Camdomblé de Salvador, que aos 70 anos se formou em Direito no Rio de Janeiro, acredita que a libertação do negro ainda é uma ilusão, pois ainda não há no país uma real igualdade. “Os negros ainda sofrem as consequências da falta de oportunidades, mas a igualdade tem que ser para todos: negros, índios, ciganos, enquanto não houver, é ilusão”, afirmou.
O Secretário de Emprego e Renda de Nova Iguaçu disse que não adiantam as cotas para o ensino superior se não houver educação de qualidade no ensino fundamental e médio, pois é enorme o contingente de pessoas que não conseguem trabalho por falta de qualificação. Ele lamentou o fim dos cursos profissionalizantes gratuitos e de qualidade, como o antigo SENAI. “Atualmente, um curso do SENAI custa caríssimo, cerca de R$ 2 mil, como o trabalhador pobre pode se qualificar? É perverso! Se não houver uma melhoria da educação pública no Brasil, não haverá negros nem para preencher a cota, porque não conseguiremos chegar lá”, alertou Luis Eduardo.

A atuação do PDT em prol da causa negra foi lembrada e exaltada pelos participantes da mesa e da plateia, como a professora Vanda Maria de Souza Ferreira, primeira diretora negra de um CAIC (Centro de Aprendizagem e Integração de Cursos). “O governador Brizola queria que a primeira diretora fosse negra, desconhecida entre os nomes conhecidos do partido, e que tivesse sido diretora de um CIEP, então meu nome foi lembrado. Ele tinha essa visão pioneira de promover e valorizar o negro. Ser negro é ter consciência de uma luta, não é cor da pele”, disse a professora.
Na plateia, José Carlos Brasileiro, ex-presidiário, atualmente presidente do Instituto de Cultura e Consciência Negra Nelson Mandela, deu um depoimento sobre o despertar de consciência que teve na prisão após assistir uma palestra da professora Vanda de Souza Ferreira, quando era detento. “Eu era um rebelde sem causa. A presença daquela mulher linda, negra, inteligente, uma autoridade que vestia um traje diferente, uma veste amarela e enfeites africanos, mexeu comigo. A partir daquele momento algo mudou em mim, na minha autoestima, eu percebi que era preto, mas não tinha consciência negra”, resumiu. O encontro dos dois no auditório da CMRJ e o depoimento de Brasileiro, recém-filiado ao PDT, levou a professora Vanda às lágrimas, para emoção de todos os presentes.
A presidente do Condedine/RJ, professora Dulce Vasconcelos, lembrou que o PDT foi o primeiro partido a ter em estatuto como prioridade de luta a igualdade racial, e que foram inúmeras as ações de Brizola nesse sentido, como colocar um negro no comando da polícia militar do Rio de Janeiro e chamar negros para ocupar espaços de poder em seu governo, e como candidatos do partido nas esferas estadual, federal e Senado. Outra ação foi a política de defesa da cidadania para os moradores das favelas, razão pela qual foi combatido fortemente por setores reacionários da sociedade, da qual a mídia era porta-voz. Contudo, Dulce vê razões para comemorar o 13 de maio:
-Estamos colhendo os frutos que nossos antepassados e os que apoiaram nossa luta plantaram. A votação das cotas foi uma prova disso, vencemos por unanimidade! As ações afirmativas, porém, são transitórias e ainda insuficientes- disse. O COMDEDINE coordena um movimento para que o recém-descoberto Cais do Valongo, na área do porto, onde milhões de negros africanos desembarcaram como escravos no Brasil, faça parte do Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana no Rio de Janeiro, incluindo também o Cemitério dos Pretos Novos e a Pedra do Sal.
Viúva de Abdias Nascimento, único Senador negro da história do país, eleito pelo PDT, a pesquisadora Elisa Larkin Nascimento, do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, disse que a contribuição do negro no campo do conhecimento não é difundida e qualificou de racismo a mentalidade que exclui o negro do passado cultural e tecnológico. “A contribuição tecnológica do negro foi sempre omitida, como se ele não tivesse um saber. A visão racista não coloca o negro como protagonista da história”.
“Nossa dívida com os negros é imensa, tudo neste país foi construído com a participação deles. O fato de existir ainda hoje partidos que questionam as cotas e os reparos sociais mostram muito bem a necessidade de fazermos este resgate de nosso povo”, disse o vereador Leonel Brizola Neto.
Com a autoridade outorgada pelo terreiro de Mãe Menininha do Gantois, Mãe Edelzuíta pegou as mãos do vereador Leonel Brizola Neto e proclamou com a fé:
- Oxalá te guie, que você tem uma missão. Leve o legado do seu avô e contribua para a compreensão mútua e a paz.
-OGUNHÊ! – a saudação de Ogum ecoou no auditório. Na tradição afro-brasileira, Ogum é o Orixá guerreiro e valente que nos ensina a lutar pelo que é certo e não esmorecer nas situações adversas. No sincretismo, ele é São Jorge, que abre os caminhos e vence as demandas.

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