sexta-feira, 25 de novembro de 2011

CBF MARCA GOL DE PLACA AO ENTRAR EM CAMPO CONTRA O RACISMO NAS RODADAS FINAIS DO CAMPEONATO BRASILEIRO

Edição: Adilson Gonçalves/ Fonte: site da CBF
Ronaldo Fenômeno:"Racismo é crime"
Um basta à discriminação e à intolerância. No momento em que a prática do racismo no futebol ganha novamente repercussão no cenário do debate em todo o mundo, com o surgimento de demonstrações recentes, como foi o caso do jogador brasileiro Edimar, no Campeonato Grego, a CBF entra em campo para promover uma campanha de repúdio que vai se materializar na 37ª rodada do Campeonato Brasileiro da Série A 2011, a "Rodada contra o Racismo".
A mensagem que a entidade vai passar nos jogos da "Rodada contra Racismo", a penúltima do Campeonato Brasileiro da Série A neste ano, é de protesto contra a intolerância que tem hostilizado muitos jogadores em gramados de vários países, e que deveria merecer a mais veemente condenação de todo o universo do futebol, como alerta o presidente Ricardo Teixeira.
- Racismo não se resolve com aperto de mão e nem quem sofre esquece no dia seguinte. Não é justificável pelo calor de uma partida, não pode ser interpretado como gesto de torcedor. É algo intolerável, que não condiz com o esporte. O futebol, como catalisador de transformações no mundo e fenômeno capaz até de interromper guerras, deve ter um papel primordial na busca de soluções para essa prática - diz o presidente.
A CBF, a confederação que tem o maior número de jogadores vítimas de preconceito, se vê na obrigação de promover uma ampla campanha contra o racismo no futebol e chamar a atenção para essa prática inaceitável para o convívio social.
- As pessoas que não entenderem que o futebol é para todos e não apenas para uma raça devem ser banidas definitivamente do esporte. Não adianta utilizar dinheiro para fazer campanhas hipócritas que não produzem efeito algum. Devemos mergulhar de cabeça nesta questão e punir exemplarmente quem comete esse tipo de intolerância. Nosso desejo é envolver os jogadores, técnicos, dirigentes e torcedores em um movimento capaz de mudar essa situação - ressaltou.
A campanha da entidade de dar um basta ao racismo recebeu nesta quinta-feira duas adesões imediatas. O técnico da Seleção Brasileira Mano Menezes mostrou-se incisivo na condenação do preconceito, uma prática que, para ele, não pode ser tratada com condescendência e com tentativas hipócritas de pedido de desculpas, mas sim com o rigor que a grave situação merece.
CBF marca gol de placa com a
 campanha contra o racismo
Ricardo Teixeira:"o futebol é o
 catalisador de emoções no mundo
O racismo no futebol não pode ser tratado e não admite meio termo. Tem de ser resolvido de maneira forte. É muito cômodo uma pessoa apertar a mão da outra depois do jogo para pedir desculpa por uma ofensa ao que ele tem de mais sagrado e significativo. A solução é buscar nos mecanismos legais que já existem a forma de haver uma punição muito rígida.
O coordenador das Seleções de base da CBF Ney Franco também condenou com veemência o racismo no futebol. Ele vivenciou recentemente, no Sul-Americano Sub-20 do Peru, em janeiro, um caso que o deixou sensibilizado e ao mesmo tempo incrédulo com o que acabara de testemunhar.

Diego Maurício foi insultado
em  janeiro deste ano no Peru
- Custei a acreditar que aquilo estivesse acontecendo. No Peru, em um jogo contra a Bolívia, na cidade de Moquegua,  uma parte dos torcedores insultou o Diego Maurício com ofensas racistas. Foi chocante e muito triste.
Ney não tem dúvida sobre o que tem der feito para banir o racismo nos estádios.
- A FIFA tem de fazer uma campanha para punir com rigor todos que pratiquem o racismo. Claro que não basta um aperto de mão ou um pedido de desculpa, é preciso haver punição.
Além dos dois técnicos, o ex-jogador Ronaldo, ídolo do futebol mundial, também comentou os recentes casos de discriminação que tem acontecido no esporte.
- Racismo é crime, vários companheiros meus já viveram isso de perto e é muito triste. Isso já deveria ter sido banido do planeta faz tempo - disse o Fenômeno.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

CARLOS ALBERTO CAÓ COMPLETA 70 ANOS COMEMORANDO AS CONQUISTAS DOS NEGROS BRASILEIROS, MAS AFIRMA: "NÓS QUEREMOS E MERECEMOS MAIS"

Texto, foto*,  edição: Adilson Gonçalves
Caó , baiano, filho de Ogun, na CMRJ,com a imagem de Oxossi 
ao fundo, padroeiro do Rio de Janeiro, cidade que o acolheu
O dia e o mês- 20 de dezembro-  que constam em sua certidão de nascimento  diferem  da data biológica-  24 de novembro - em que ele veio ao mundo, mas o ano é o mesmo: 1941. Pois nesta data, há 70 anos,  portanto, nascia em Salvador, na Bahia, Carlos Alberto Oliveira dos Santos, ou simplesmente Caó, filho do marceneiro Themístocles Oliveira dos Santos e da costureira Martinha Oliveira dos Santos, a dona Miúda.
A reverência ao líder é constante
 Figura emblemática do movimento negro brasileiro,  Caó foi eleito  duas vezes-  1982 e 1986-  deputado federal , a última como constituinte,  pelo Partido Democrático Trabalhista, o  PDT. Como parlamentar constituinte, ele foi o autor da revolucionária lei 7716/89, que criminaliza como crimes não somente a prática de racismo, concernentes ao povo negro, mas entre outras práticas ilícitas, a xenofobia e a intolerância religiosa, que abrange todas as religiões.
Carlos Alberto Oliveira dos Santos é o filho mais velho de seu Themistócles e dona Martinha, ambos já falecidos. Seus dois outros irmãos, Derivaldo e Eliene, também já morreram. A mãe, dona Miúda, costurava para a alta sociedade baiana e foi através de um pedido seu a uma de suas várias clientes que conseguiu matricular o primogênito no tradicional colégio soteropolitano Antônio Vieira, onde era o único aluno negro.
Recentemente entrevistado para o programa  Espelho, apresentado pelo ator e diretor Lázaro Ramos, ele falando sobre sua infância em Salvador, revelou  que sua primeira contestação a um ato de racismo sofrido ocorreu no colégio
- Todo ano uma peça era encenada e por dois deles, fui escalado para interpretar o personagem do diabo.  Na segunda vez eu  recusei e joguei mercúrio cromo nas paredes do colégio. Minha mãe foi chamada à escola e comunicada do meu ato.  Ao chegar em casa, ela  me falou que meu pai resolveria a questão quando voltasse do trabalho. Meu pai, seu Themístocles,  era marceneiro, homem de poucas palavras e com um cinto de couro de dois dedos de espessura. Com medo, fugi de casa, mas voltei, me escondendo dentro dela. Quando ele chegou e minha mãe falou com ele, fui chamado. Com muito medo da surra, saí de onde estava escondido e me apresentei . Ele me perguntou o por quê  da peraltice e eu respondi que estava cansado de ser escalado para interpretar o Diabo e queria ser Deus, que nunca deixavam.  Ele concordou comigo e a surra não aconteceu- contou  Caó.
Caó, Rosinha e Cacau ou
Carlos Alberto Oliveira, Rosa e Carlos em um momento de descontração
 
Precocemente articulado, Caó aos 16 anos já era secretário-geral da Associação de Moradores do bairro Federação em Salvador e estava engajado na campanha O Petróleo é Nosso. Pouquíssimo tempo depois, viriam a militância no movimento estudantil, como presidente da União de Estudantes  Estaduais da Bahia e a vice-presidência da União Nacional dos Estudantes. A partir disso a militância partidária era questão de tempo, ele ingressou no Partido Comunista Brasileiro. Após o fim de um Inquérito Policial Militar (IPM), ele foi preso, chegando a ser condenado e cumprir seis meses de prisão, sendo libertado por decisão do Superior Tribunal Militar. A intensa atuação em vários segmentos políticos, tornou-o “carta marcada” em Salvador e conhecidos de seus pais os aconselharam a tirar o filho da cidade, “antes que sumissem com o  Betinho”, com era chamado familiarmente.
Apesar de afastado da política, a participação
 constante em vários eventos da comunidade negra 
A solução mais prudente foi sair de Salvador e ir para o Rio Janeiro. Chegando à cidade, trabalhou inicialmente como corretor de imóveis, mas atuou neste setor por pouco tempo. No mesmo ano começou a trabalhar como repórter do jornal Luta Democrática, Tribuna Carioca, Tribuna da Imprensa, O Jornal, Jornal do Commércio, TV Tupi e Jornal do Brasil, onde entrou como repórter e chegou a sub-editor e  editor. Em 1967 formou-se em Direito.
 Nesse meio tempo, foi um dos fundadores da Associação de Jornalistas de Economia e Finanças (AJef), em  1974, presidindo-a no ano seguinte. Também criou o Clube dos Repórteres Políticos, do qual foi secretário geral. Em seguida foi presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro, onde conseguiu uma conquista épica, de modo atípico: sem greve ou qualquer  outro ato de intimidação ao patronato,  ele liderou  vários jornalistas, todos de braços, em uma caminhada até o prédio das empresas Bloch, na Glória e  ao final das negociações o resultado foi um aumento de 100% para a categoria, algo, senão inédito, raro, na história do sindicalismo  brasileiro.
Por questão numerológica ou apenas coincidência, o número dois está presente nas lembranças e conquistas de Caó ao longo da vida: teve dois irmãos – Derivaldo e Eliene- , por duas vezes foi  presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, duas vezes foi secretário de Habitação e Trabalho do governo estadual, na gestão de Leonel Brizola, igual número de vezes elegeu-se deputado federal pelo PDT e tem um casal de filhos, os quais apesar de já adultos, chama carinhosamente de Cacau e Rosinha, como todo pai baiano, afável e carinhoso. Em um breve balanço de seus 70 anos e a evolução e conquistas dos negros brasileiros, na qual teve efetiva participação, ele avalia e afirma:
- A situação melhorou muito, mas ainda hoje muitos atos de racismo e intolerância são praticados. Melhorou, mas ainda temos muito a conquistar, pois nós queremos, e merecemos, mais. E eu estarei vivo para presenciar isso.